As abelhas não produzem apenas mel. Segundo especialistas da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), um terço da produção mundial de alimentos depende desses insetos. Elas são responsáveis por polinizar mais de 70% das culturas do planeta, desde frutas até hortaliças. No entanto, enfrentam múltiplas ameaças, desde o uso de pesticidas até as mudanças climáticas. Por isso, trabalhar com abelhas é uma oportunidade para ensinar Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM) a partir de uma perspectiva prática, crítica e conectada com os desafios reais do entorno.
Partindo dessa premissa, o projeto “Abejas polinizadoras” criou um protótipo que permite medir as populações de abelhas e sua relação com a qualidade dos cultivos de framboesa andina (Rubus glaucus), fruta muito comum na região de José María Vargas, Táchira, na Venezuela. A inovação foi desenvolvida por uma equipe de quatro estudantes, sendo finalista regional da edição 2024 do Solve for Tomorrow – Região América Central e Caribe, que reúne 11 países: Barbados, Belize, Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Panamá, República Dominicana e Venezuela.
Os participantes eram quatro estudantes do quinto ano da educação, o último da escolaridade obrigatória. A instituição onde estudam, Liceo Nacional Fermín Ruiz Valero, tem experiência em criar projeto STEM sobre meio ambiente, inclusive para inscrição no Solve for Tomorrow. O professor mediador, Anderson Pérez, é especialista em Biologia e Química, e conta que os jovens decidiram primeiramente trabalhar com abelhas. “Mas lhes disse que era um tema muito amplo, então tentamos incorporar uma forma para que o projeto pudesse deixar algo ao município e servir aos agricultores, com um produto de maior qualidade”, observa.
Perceberam que em sua comunidade, como em muitas regiões agrícolas, a manutenção da biodiversidade e dos insetos polinizadores está em risco devido ao uso indiscriminado de agroquímicos. Por isso, o primeiro passo foi identificar fatores como temperatura e umidade, que podem afetar a qualidade de vida das abelhas.
O protótipo final passou de uma caixinha de papelão para uma caixa feita em plástico por impressão 3D. A equipe cuidou dos detalhes: fez a caixa amarela (cor que atrai as abelhas) e usou doce para aumentar a atratividade. Sensores internos contam parâmetros como quantidade, temperatura e umidade, exibidos em uma tela LED.
As análises laboratoriais foram realizadas com o apoio de especialistas e o grupo também contou com um engenheiro agrônomo. “Com esse apoio, conseguiram estabelecer o objetivo de criar um protótipo para contar a população de abelhas. A ideia, no fim, era ter um dispositivo pequeno que pudesse ser instalado em qualquer parte da plantação”, explica Pérez. A caixa tem porta de entrada e saída. Monitorando esses movimentos, o protótipo contabiliza quantas abelhas estão simultaneamente no interior.

Além disso, contaram com suporte da Universidade Nacional Experimental de Táchira para conhecimento técnico e de uma academia de robótica próxima para montagem. “Eles nos dedicaram atenção personalizada para fabricar o protótipo, desenhar a caixa e instalar a rede de fios. Também deram uma aula aos estudantes para que eles próprios pudessem manusear os equipamentos”, complementa.
Por meio do bluetooth, o sistema se conecta a um APK (Android Application Package), que é um formato de arquivo usado para instalar programas em Android. Assim, os dados da produção são transmitidos em tempo real para os agricultores.
E por que é importante ter esse controle das abelhas? O professor explica: para garantir que a produção da framboesa andina seja elevada e que os frutos tenham qualidade. “Se não houver abelhas, isso é um alerta para os produtores de que a colheita pode cair”, conclui.
O projeto STEM sobre meio ambiente requer empatia
Mesmo levando em consideração o tempo todo o objetivo de melhorar a produção, os estudantes não esqueceram da qualidade de vida das abelhas. Para oferecer mais conforto, foi necessário limitar a quantidade de abelhas na caixa. Ou seja, além de contar quantas entram, era preciso fechar a entrada ao atingir o número máximo. Em teoria, parece simples, mas o material da caixa tinha pouca aderência. Isso dificultou fixar o servomotor e posicionar as polias corretamente. Outro desafio foi calibrar o tempo de abertura. Com muitos testes, perseverança e apoio dos parceiros, conseguiram usar a programação para organizar os circuitos e fazer tudo funcionar.
O projeto pode ser replicado em outras comunidades e países, aumentando a resiliência de ecossistemas agrícolas, gerando renda para as famílias e contribuindo com a segurança alimentar. “Todas as experiências que tivemos como educadores, em um país com tantas limitações, nos trouxeram muitos aprendizados. Ver um pequeno grupo de estudantes de um povoado assim nos enche de orgulho”, declara.
A fase de testes ocorreu em uma plantação da framboesa do município. A princípio, selecionaram várias áreas produtoras, mas perceberam que cada uma tinha condições climáticas diferentes e que isso afetava o número de abelhas. Por isso, decidiram focar em apenas uma.
Foi bonito compartilhar com eles essa experiência de ir direto à realidade, ao campo, diz o professor.
Lidar com os proprietários também foi um exercício de comunicação para os estudantes: “A forma como explicaram os objetivos do projeto e o processo fez com que os agricultores abrissem suas portas para a equipe”, acrescenta.
Aprender para ensinar
De acordo com o educador, o projeto teve bons resultados em todo o município. “Outros estudantes que não participaram do Solve for Tomorrow agora dizem que querem entrar também”, comenta.
Aos colegas professores, Pérez deixa um conselho: “Não há fórmula. Mas precisamos querer aprender mais. Não podemos nos contentar com uma licenciatura, temos que seguir aprendendo para poder ensinar melhor”.
E, para envolver os estudantes, um bom ponto de partida pode ser aproveitar datas comemorativas como o Dia Mundial das Abelhas (20 de maio) e o Dia Mundial do Meio Ambiente (5 de junho), para fazer um projeto STEM sobre meio ambiente.