Incêndios caseiros têm consequências devastadoras – lares e empresas são destruídos e pessoas podem ser gravemente feridas, causando impactos físicos e psicológicos em centenas de milhares de pessoas. E foi justamente esse mote, apresentado pela estudante Millaray Gómez, da escola Bernadette College, de La Florida, região metropolitana de Santiago, no Chile, que fundamentou o Leak Detector (Leak-D), dispositivo de baixo custo para identificação de vazamentos de gás.
A jovem, que havia recém-perdido um membro da família em um incêndio doméstico, apresentou a proposta aos colegas Darling Bustamante e Cristóbal Cheuquel e à professora de química Liliana Gutiérrez Castro, que é responsável por coordenar as atividades laboratoriais da escola, bem como apoiar projetos e iniciativas STEM dos discentes. “Millaray estava muito mobilizada com o que havia acontecido com sua família e determinada em se envolver de alguma forma com uma resposta para o acontecido”, explica a professora. “Com o apoio dos colegas, e a partir de convocatórias científicas para feiras e mostras, nós decidimos juntos enfrentar a questão”, explica.
Como início do projeto, Liliana orientou o grupo para uma pesquisa sistemática sobre o problema, tanto em artigos científicos quanto em notícias de jornais e sites da internet. “Para que eles avançassem era preciso compreender de fato a problemática, identificando as limitações nas soluções existentes”, justifica. Como produto da etapa, os jovens perceberam que os alarmes de incêndio existentes são custosos e muitos não conseguem captar os diferentes tipos de gás – o líquido e o natural. O gás líquido ou liquefeito (GLP) é um derivado do petróleo comercializado em botijões e o gás natural é encanado, comercializado por grandes concessionárias.
O início, por conta da pandemia, foi todo feito na casa dos estudantes e da professora. Como ela morava mais perto de Santiago, onde era mais fácil conseguir os materiais, ela ficou responsável pelas primeiras ideações, operando as instruções dos jovens. “Nós ligávamos a câmera e eles me instruíam com o que fazer”, explica. Com base em estudos e desenhos iniciais, o grupo conseguiu avançar em um primeiro protótipo, praticamente todo construído com materiais recicláveis. “Um dos nossos desafios foi estabelecer um circuito simples em um circuito elétrico sensível e para isso contamos com o apoio de um colega professor”, justifica. Ela explica que o processo de ideação contou com uma grande chuva de ideias, em que todos – estudantes e professores convidados – apresentavam suas propostas para a solução do problema.
Quando puderam retornar à escola, ainda que em sistema rotativo, os alunos assumiram a prototipagem e os testes. “Eles ficavam até tarde e contaram com colaboração e apoio de suas famílias”, identifica Liliana.
O dispositivo desenvolvido consiste em um sensor de gás, um sistema led, um alarme e uma bateria. Quando há presença de gás no ambiente, o sensor aciona a luz e emite um alarme sonoro. Nos outros modelos, eles adicionaram um botão de ligar e desligar e adequaram a carcaça com um soquete para carregamento em um receptáculo para lâmpadas. “Embora, é claro, sejam necessários mais ajustes, os meninos de fato criaram uma solução potente, de baixo custo, que pode mudar a vida de muitas pessoas”, celebra a docente.
O protótipo foi qualificado com o apoio da Universidade do Desenvolvimento, em conexão estabelecida por Tomás Ffrench-David, um dos mentores que acompanhou o grupo pelo Samsung Solve for Tomorrow. “A ideia da lâmpada led foi resultado das discussões e colaboração desses especialistas, que certamente apoiaram os jovens também a pensar fora da caixa e a, inclusive, compreender a potência da solução que estavam desenvolvendo”, justifica.
Para a docente, os jovens avançaram muito na criação da proposta e aprenderam a colaborar, a sistematizar ideias e principalmente a pensar criativamente. “Quando potencializamos práticas de pesquisa na escola, potencializamos inovação: é uma experiência que produz uma transformação grande, ensina os jovens a terem mais segurança, capacidade de sistematizar os conhecimentos curriculares a partir de suas inquietações, a perder o medo de tentar, a adquirir conhecimento com segurança. Isso dá sentido para a aprendizagem”, afirma a docente. Segundo Liliana, a Abordagem Baseada em Projetos (PBL) e os conhecimentos STEM convidam os estudantes a realizarem exercícios concretos. “Nesse caso, eles tiveram que não apenas revisitar, mas avançar na compreensão de circuitos elétricos, eletricidade, comportamento dos gases e construção e leitura de gráficos. São ferramentas e conhecimentos que levarão para a vida e isso me motiva como professora: apoiá-los, como mediadora, a construírem seus próprios percursos de aprendizagem”, conclui.