Na comunidade de Nuevo Chirimoto, no Peru, a principal atividade econômica é a produção e comercialização de café, realizada principalmente por famílias, de forma manual, com muito trabalho e sem muita intervenção tecnológica. Para facilitar o processo, aumentar a produção e garantir maior segurança, uma equipe de estudantes locais criou uma forma de mecanizar o trabalho, com uma máquina que despolpa o café, sacode, limpa bem com água pura e retira pronto para secar. A inovação foi finalista da 10ª edição do Solve for Tomorrow no país.
Os estudantes tinham 15 anos e cursavam o 3º ano, que é o ano de ingresso nos “Colegios de Alto Rendimiento” (COAR). Quando o professor James Padilla, mediador deste projeto, entrou nas aulas para convidar todos a participarem do Solve for Tomorrow, a aluna Angeli Tatiana decidiu formar uma equipe com os colegas. “Muitos têm parentes agricultores que trabalham com café e o avô de duas estudantes sofria de artrose. Então, queriam encontrar uma forma de evitar que ele adoecesse e permitir que continuasse trabalhando, que é o que ele quer”, lembra o educador.
As netas desse potencial “cliente” são Tatiana e Katty, que conseguiram a participação de um importante aliado: o tio, que também é agricultor e engenheiro industrial. A família avalia que o avô sofre com essas dores devido a décadas de trabalho na lavoura, com má postura e grande esforço físico. “Mas vimos a necessidade não só da família, mas de toda a cidade. Concluímos que uma máquina para mecanizar a lavagem do café poderia ser benéfica para toda a comunidade, já que poderiam compartilhá-la, talvez alugar para outros agricultores que não têm a possibilidade de comprar um para si”, avalia Padilla.
Segundo o educador, as estatísticas consideradas no projeto mostram que há cerca de 500 famílias produtoras da região, das quais 30 foram entrevistadas, por limitações de tempo e internet. “Vimos que os idosos permanecem na localidade, com a agricultura, enquanto os mais jovens às vezes migram para cidades maiores para estudar ou trabalhar. Portanto, nosso propósito foi ajudar esses avós”, declara.
Design thinking ajudou a estruturar o projeto
James Padilla é professor de tecnologia na escola. Com formação em Engenharia de Sistemas de Produção, começou a lecionar em 2017. Hoje, ministra aulas de robótica, aplicativos mobile, design gráfico e Arduino, entre outros. Ele destaca que na escola já se estudam metodologias STEM e principalmente no terceiro ano são indicadas as cinco fases da trilha de projetos: Empatia, Definição, Ideação, Protótipo e Teste. “Eles queriam fazer logo a máquina, mas eu disse a eles que essa era apenas a quarta etapa. Então, avançamos em cada etapa no seu tempo”, lembra. Para ele, seguir esse caminho foi importante para dedicar o tempo necessário à busca e para que pudessem focar não apenas no resultado, mas também desenvolver o pensamento crítico e outras habilidades durante a pesquisa.
Acho que a experiência nos ensinou a importância da experiência do usuário, além de seguir à risca um design inicial. Não podemos pensar na máquina isoladamente, mas sim no dia a dia de quem vai utilizar usar”, acredita Padilla
O tio aliado já tinha feito uma máquina parecida antes, mas era muito grande, industrial e eles mudaram isso também. “Tendo em conta esta referência e com a ajuda do tio, os estudantes melhoraram o protótipo e fizeram um mais pequeno para poder ser transportado em uma caminhonete normal”, explica. Ele também foi importante para informar especificações dos materiais necessários à construção.
Com a mecanização, a lavagem é muito mais rápida
Os agricultores podem colocar café em uma parte do protótipo em forma de funil. Com um motor acoplado, a máquina gira o café, movimentando os pólos e as hélices em seu interior. O movimento, aliado ao impacto da água que sai do jato, garante uma lavagem eficaz do fruto. Veja mais detalhes dessa operação no vídeo abaixo:
Por fim, testando a capacidade da máquina, conseguiram estimar que é capaz de lavar mil quilos por hora. Manualmente, esse processo leva aproximadamente quatro vezes mais tempo. “Com a máquina, você também tem muito mais controle, pois quando se lava manualmente em uma malha, os grãos de café inevitavelmente se perdem”, acrescenta o educador.
O protótipo foi entregue às familias dos estudantes que apoiaram o desenvolvimento desde o início e, ainda, adquiriram todos os materiais necessários. “É uma solução que não é muito cara, se comparada às opções disponíveis no mercado. Gastamos apenas 3.200 soles, ou seja, 845 dólares”, relata. O professor explica que, em outros países, uma máquina como essa custa cerca de 6 mil soles (ou 1.600 dólares) e, no Peru, é muito difícil encontrar o equipamento à venda. O investimento inicial compensa com o tempo: a vida útil estimada é de 20 anos e a máquina pode ser alugada para outros produtores, já que a lavagem do café normalmente não é uma demanda diária. A família dos estudantes inclusive já aluga para outros agricultores próximos.
O professor acrescenta que era importante ter conhecimentos em Economia: “Achamos que há potencial de vendas para essas máquinas, já que há um boom no mercado de café. Fizemos pesquisas e vimos que conseguiríamos vender cerca de 100 máquinas por mês.”
Os estudantes ainda têm dois anos de estudos até ao final da escolaridade obrigatória e continuam com o objetivo de aperfeiçoar este projeto. “O que queríamos agora é expandir as entrevistas a mais pessoas e o prefeito prometeu que vai colocar uma antena por perto para que os estudantes tenham internet e possam fazer os inquéritos de forma mais rápida e online”, afirma. Além disso, segundo ele, a máquina pode ser alterada para atender diferentes necessidades, em tamanho e capacidade, por exemplo, e pode ser utilizada em outros países, como Brasil e Colômbia, que também têm destaque nessa produção.
Segundo o professor, chegar aos finalistas do Solve for Tomorrow serve de inspiração para a comunidade escolar. “Muitos estão entusiasmados em poder se inscrever este ano com mais projetos. O programa nos dá mais do que às vezes imaginamos, principalmente aos jovens”, declara.