Você já viu alguém próximo sofrendo de um problema de saúde e quis criar uma fórmula mágica para resolver o problema? Quando uma educadora e um grupo de estudantes de Belize se conectaram para compartilhar suas experiências com pacientes com AVC, eles não conseguiram fazer mágica, mas encontraram uma maneira de facilitar a vida deles. O projeto “AODI” (Assistance Oral Device Interface ou “Interface de Dispositivo Oral de Assistência”, em português) desenvolveu um dispositivo que pode traduzir sinais e movimentos das mãos em palavras, melhorando a comunicação entre pacientes e cuidadores.
A inovação inclusiva utilizou STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) para acessibilidade e foi finalista em 2024 do Solve for Tomorrow – região América Central e Caribe, que reúne 11 países: Barbados, Belize, Costa Rica, República Dominicana, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Panamá e Venezuela.
Cinco estudantes entre 14 e 17 anos participaram, do 10º ao 12º ano, dos últimos três anos da escolaridade obrigatória. A professora mediadora foi Ardeth Rudon, que também é vice-diretora de Relações Acadêmicas e está na Ladyville Technical High School há 24 anos. Foi sua primeira participação no Solve for Tomorrow. O projeto começou com o professor Abraham Flowers, vencedor do Solve for Tomorrow em 2023, com o projeto “SMARTZ“, mas ele foi transferido para outra escola no meio do ano letivo. Ele também foi o fundador do LT Robotics Club, onde cerca de 20 estudantes têm a oportunidade de explorar seus interesses em tecnologia.
A Ladyville Technical High School, onde o projeto nasceu, está localizada em uma área rural, nos arredores da principal cidade do país (Cidade de Belize). A escola funciona como um centro para a comunidade e, portanto, pretende ajudar as pessoas a resolver desafios sociais por meio da educação, especialmente no Clube de Robótica LT, onde o “AODI” começou. “Fizemos uma tempestade de ideias, discutindo questões que os membros da comunidade enfrentam e um desses problemas era a saúde. Nos perguntamos: como podemos ter uma abordagem diferente para isso?”, lembra Rudon. Então, uma das adolescentes, Adaobi Thomas, falou sobre sua tia, que sofreu um derrame, e o marido de Rudon também havia sofrido com a doença. “Era um assunto muito próximo de nós. Aprofundamos a perspectiva, decidimos fazer algo para ajudar e continuamos nossa pesquisa”, narra a professora.

O grupo descobriu que o AVC é uma das principais causas de morte em Belize. Com os dados, a experiência pessoal e a perspectiva mais ampla que impacta a comunidade e o país, eles decidiram se concentrar nesse tópico. Descobriram então que muitos pacientes desenvolvem dificuldades para falar e que a incapacidade de se comunicar os deixa frustrados. As informações coletadas coincidiam com o que seus familiares estavam vivenciando. “Quando você mora com alguém que sofreu um AVC, você também se sente frustrado e impotente por não conseguir se comunicar. Decidimos criar algo para ajudar”, diz a professora.
Além disso, a educadora explica que, quando as pessoas sofrem um AVC pela primeira vez, suas línguas ficam pesadas e elas podem apresentar distúrbios na fala, possivelmente provocando a mudez. As primeiras 72 horas após um episódio de saúde como esse são cruciais, pois podem sofrer outro AVC e a falta de comunicação pode dificultar ainda mais a identificação de sinais e a prevenção de novas lesões. “E se pudéssemos ter esse dispositivo que permitisse a comunicação com apenas um estalar de dedos?”, a equipe começou a se perguntar.
Eles fizeram uma lista de materiais necessários: fios para conectar o sistema, sensores flexíveis, botões reguladores, algo para estabilizar a invenção e uma placa Arduino, uma placa de prototipagem eletrônica de código aberto.
Fazer projetos STEM como este ensina os estudantes a encontrar soluções para as dificuldades da vida, para que não fiquem estagnados no futuro. Se encontrarmos maneiras de resolver problemas, tornaremos o mundo um lugar melhor, declara a educadora.
Para usar o protótipo, o paciente colocava a luva na mão e precisava apenas mover os dedos para transmitir mensagens por meio de sensores. Os algoritmos utilizados no projeto traduziriam os sinais em palavras exibidas em uma tela LCD (tecnologia de exibição que utiliza cristais líquidos e polarizadores de luz para formar imagens). Ela consegue decodificar palavras e expressões de até 14 caracteres, como “bom dia”, “sim”, “não” e “preciso dos meus remédios”. Para maior conforto, eles também colocam velcro e um regulador para que o paciente possa adaptar a luva à mão.
A equipe teve que treinar a máquina com programação para definir alguns movimentos dos dedos e seus respectivos significados. Mas o que torna o AODI uma inovação ainda mais inclusiva é a personalização que se adapta às necessidades individuais. O paciente pode não estar falando nada, enquanto outros podem dizer algumas palavras, mas precisam de outro conjunto de expressões. Por exemplo, o movimento do polegar significa “preciso de remédio” para uma pessoa, mas pode ser redefinido para significar “quero água”.
Outra vantagem é que esse protótipo pode sair dez vezes mais barato que os do mercado: enquanto um aparelho como esse pode custar até 500 dólares americanos, com a personalização, o AODI pode custar até 50 dólares.

Superando desafios para criar uma inovação inclusiva
Durante o projeto, o grupo enfrentou vários desafios. Alguns fios queimaram por estarem consumindo muita voltagem e tiveram que trocá-los por novos e aprender a regulá-los corretamente. Além disso, alguns dias antes de viajarem para a final do Solve for Tomorrow, na Guatemala, quase toda a equipe adoeceu. “Eu os vi estudando até no hospital, eles não queriam desistir no momento final”, lembra Rudon. “Passamos por momentos difíceis, mas em vez de ficarmos frustrados, rimos, fizemos uma pausa, comemos alguma coisa e voltamos ao trabalho”, acrescenta.
Mesmo com as dificuldades, eles se esforçaram ao máximo. Para testar o AODI, um dos estudantes até testou com sua tia, que sofreu um derrame. Ela estava animada para descobrir algo novo que pudesse fazer a diferença em sua comunicação com a família. Eles testaram entre si e com alguns professores, mas não tiveram tempo para testar com mais pacientes, algo que gostariam de fazer no futuro.
Rudon também vê muitas outras possibilidades para aprimorar o AODI, como expandir a quantidade de frases e palavras, personalizar o dispositivo com diferentes cores e materiais e torná-lo à prova d’água. O grupo quer adicionar recursos Bluetooth e uma versão em áudio das mensagens que já aparecem na tela LCD em formato de texto.
A educadora reconhece que a comunidade também desempenhou um papel importante. Ela lembra que, quando os pais descobriram que a escola representava todo o país no Solve for Tomorrow, ficaram animados e engajados com o processo. “Eles vieram apoiar, se ofereceram para ajudar com o transporte. Eles garantiram a participação das crianças mesmo durante as enchentes. Eles sempre encontravam um jeito de levá-las até lá”, acrescenta.
Com o sucesso do AODI, o Ministério da Educação de Belize está entusiasmado em investir na ideia e já contribuiu financeiramente para que o grupo produzisse mais 10 protótipos a serem replicados em outras comunidades. “Isso também é muito importante para a escola. Nos coloca em evidência para projetos futuros. Nos coloca no mapa”, finaliza.