Apesar da facilidade no uso, as fraldas descartáveis representam impactos ambientais e financeiros. Com o uso frequente, comprar fraldas pesa no orçamento. Além disso, podem permanecer no meio ambiente por até 450 anos após o descarte. Para melhorar esse quadro, um grupo de cinco estudantes do sertão brasileiro desenvolveu fraldas reutilizáveis com material comum na região: fibras de casca de coco que seriam descartadas por indústrias. O projeto ficou entre os 10 finalistas do programa Solve for Tomorrow em 2023, no Brasil.
O professor de química Gustavo Bezerra, mediador do projeto “EKOfraldas” na Escola Técnica Estadual Paulo Freire, no município de Carnaíba, sertão pernambucano, lembra que a ideia surgiu em uma disciplina eletiva chamada “STEM na prática”, com 28 alunos do 2º ano do Ensino Médio (penúltimo ano da escolarização obrigatória). No colégio, o ensino regular é ofertado junto com cursos técnicos em redes de computadores ou administração, em tempo integral. “Havia muitos alunos com interesse em desenvolver projetos científicos, mas eles não tinham conhecimento da base metodológica exigida para feiras e programas como o Solve for Tomorrow. Então, nessa disciplina, a gente viu um pouco como é o método de pesquisa, como são cobradas essas abordagens em programas distintos”, relata.
A turma foi dividida em grupos de 3 a 5 estudantes, e cada um deles trabalhou em um projeto diferente. As “EKOfraldas” foram resultado da pesquisa e da experimentação de um grupo de cinco alunos. Eles tiveram como ponto de partida os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), que são 17 planos ambiciosos e interconectados propostos pelas Nações Unidas, para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima, dentre outras ações.
Provocados pelas discussões em sala de aula, os estudantes observaram que os gastos com fraldas descartáveis pesavam no orçamento das suas próprias famílias e, além disso, agrediam o meio ambiente. Por isso, pensaram que uma forma de solucionar as duas problemáticas seria criar uma fralda ecológica mais acessível, já que as disponíveis no mercado estavam fora do alcance da maioria da população. “Os alunos encontraram na internet um kit de oito fraldas ecológicas que custava R$ 330 (aproximadamente 64 dólares americanos). Uma família de baixa renda aqui do interior de Pernambuco, por mais que quisesse, não teria condições de comprar”, relata o professor.
Casca de coco e tecidos de algodão formam parte da solução sustentável
O projeto inicial, por conta do contexto de pandemia, era reaproveitar tecidos de máscaras usadas. Mas ao longo dos experimentos, os estudantes descobriram que esses produtos também possuem alto tempo de decomposição. Então, eles partiram em busca de outros materiais absorventes, até chegar à combinação de tecidos de algodão com a casca de coco.
O protótipo de “EKOfraldas” consiste em uma calça de tecido com elástico, reutilizável, acompanhada de cartuchos absorventes, que devem ser trocados após o uso. Esses cartuchos são feitos de uma camada externa de plástico biodegradável, que evita o vazamento de líquidos e odores. Por dentro, entra algodão combinado com a fibra de coco, que é capaz de absorver líquidos em até 25 vezes do seu volume inicial. Para evitar o contato direto das fibras com a pele do bebê, o cartucho é finalizado com mais uma camada de tecido. “Para uma próxima etapa, pretendemos fazer testes mais elaborados, de alergia e fisiológicos, que são essenciais antes de testar em pessoas”, complementa o educador.
De acordo com os cálculos dos alunos, a fralda reutilizável custa um real e cada cartucho biodegradável sairia por 40 centavos. “Para desenvolver o protótipo, parte do custo foi da escola, outros custos do professor e alguns materiais, como o algodão, os alunos conseguiam com seus pais. Em cima disso, eles fizeram esse estudo financeiro. É claro que se as fraldas fossem produzidas em escala comercial, teria que acrescentar mais custos, como da mão de obra. Mesmo assim, eles não seriam tão altos e exorbitantes quanto no mercado”, destaca o professor mediador do projeto.
Eu acredito que o projeto mudou muito a vida dos estudantes. Muitos nos surpreenderam, porque a gente via que não eram tão empenhados em sala de aula. Mas, quando se envolveram nos projetos, passaram a se dedicar tanto que se tornaram alunos nota 10 naquele aspecto, na parte da pesquisa, das técnicas de laboratórios, diz o professor.
De um experimento à carreira científica
O protótipo foi testado com sucesso em bonecos. Mesmo em ano de estudos para o vestibular, a equipe já deu início ao processo de patente e pretende continuar trabalhando no desenvolvimento do produto. Com a visibilidade dada pelo Solve for Tomorrow, a escola já recebeu contatos de empresas privadas e de instituições de pesquisa, como o Instituto Federal do Pará (IFPA), que ofereceram a estrutura de seus laboratórios para continuar os testes com as fraldas sustentáveis.
Mas, para além dos resultados do protótipo, a aprendizagem baseada em projetos também possibilitou novas perspectivas para os jovens da região, que veem na ciência a oportunidade de contribuir com suas comunidades, visitar novos lugares e pensar em possibilidades de carreira que antes não conheciam. A experiência dos estudantes que desenvolveram as fraldas virou referência para outros alunos e para a população do sertão pernambucano.
De acordo com o professor, a mentoria oferecida pelo Solve for Tomorrow mostrou caminhos de pesquisa, deu conselhos e contribuiu para mostrar respostas às dificuldades que apareceram no percurso científico. “A mentoria realmente chega com ideias do que os estudantes podem fazer, o papel deles na nossa pesquisa foi essencial. Agora, outros professores e equipes da escola também querem entrar no programa”, conta.